Dois anos depois do primeiro pleito de que participei (as eleições municipais de 1996), votei pela primeira vez em uma eleição nacional. Daquele momento em diante, participaria das eleições para presidente, governador, senador e deputados. Estava animado até certo ponto pela possibilidade de votar pela primeira vez para presidente da República, mas um tanto decepcionado pelos acontecimentos do ano anterior: a compra de votos pelo então governo para a aprovação da emenda que possibilitava aos membros do Executivo concorrerem à reeleição, que entraria em vigor naquele ano de 1998. Outra modificação era relativa às datas das votações: até então, o primeiro turno era sempre em 3 de outubro e o segundo, em 15 de novembro. Daquela eleição em diante, a primeira votação seria sempre no primeiro domingo, e a segunda, no último domingo de outubro.
Até aí, nada demais. Mas as eleições presidenciais, à medida que a campanha avançava, não me empolgaram nem um pouco. Como o esperado, o então presidente Fernando Henrique Cardoso tentou a reeleição juntamente com o vice Marco Maciel, numa coligação de seis partidos (PSDB, PFL, PPB, PTB, PSL e PSD). Sua mais forte concorrente era considerada a "chapa dos sonhos" da esquerda brasileira, composta por Luiz Inácio Lula da Silva (candidato pela terceira vez) e seu vice, o ex-governador gaúcho e fluminense Leonel Brizola, que havia sido candidato duas vezes ao Planalto. A coligação era, digamos, a nata do esquerdismo nacional na época (PT, PDT, PSB, PCdoB e PCB). Correndo por fora, o ex-governador cearense Ciro Gomes (ex-ministro da Fazenda), tendo como vice Roberto Freire, na coligação liderada pelo PPS e formada pelos hoje extintos PL e PAN.
Além destes três, mais nove candidatos tentaram a Presidência. Entre eles, Enéas Carneiro (PRONA), candidato pela terceira vez, assim como Lula. O ano marcou a primeira candidatura dos hoje xarás veteranos José Maria de Almeida (PSTU) e José Maria Eymael (PSDC), além da única candidatura de Alfredo Sirkis (PV) à Presidência - acabou em sexto com pouco mais de 210 mil votos, mas não ficou de mãos vazias: um vereador carioca foi eleito deputado e, como Sirkis era suplente, tomou posse em seu lugar. Além disso, uma dos candidatos era mulher, pela segunda vez: Thereza Ruiz (PTN), que ocupou grande parte de seu tempo no horário político a criticar o candidato do PPB ao governo paulista, Paulo Maluf.
Eu não estava satisfeito com o governo FHC, e temia votar em Lula por causa de Brizola e seus governos no estado do Rio, cujas consequências se fazem sentir até hoje (aliás, muitos acreditam até hoje que a simples presença de Brizola na chapa foi determinante para a derrota de Lula em 1998). Por outro lado, o programa de Ciro Gomes me era o mais convincente, o que me fez lhe dar o voto. Mas Fernando Henrique Cardoso acabou reeleito no primeiro turno (assim como havia feito em 1994), com 35.936.540 votos (53,06% dos votos válidos), com Lula em segundo (21.475.218 votos, 31,71%) e Ciro em terceiro (7.426.190 votos, 10,97%). FHC foi o vitorioso no Distrito Federal e em quase todos os estados, exceto Ceará (onde Ciro chegou na frente), Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro (onde Lula obteve mais votos).
A vitória de Lula no Rio se deve, em grande parte, à aliança nacional forçada pelo diretório nacional petista, chefiado entre outros por José Dirceu - inicialmente, o candidato do PT ao governo do estado seria Vladimir Palmeira (que o seria, sem a mesma força política de então, oito anos mais tarde), mas a direção nacional praticamente obrigou o partido a se coligar com o PDT de Brizola, que lançou pela segunda vez seguida a candidatura de Anthony Garotinho ao governo. Os petistas indicaram a senadora Benedita da Silva como vice de Garotinho, e o PSB indicou o ex-prefeito carioca e então vereador Roberto Saturnino Braga como candidato da coligação (que também contava com PCdoB e PCB, ou seja, os mesmos cinco partidos da chapa nacional) ao Senado.
O então governador, o tucano Marcello Alencar, estava politicamente desgastado, num governo cheio de acusações de corrupção, e decidiu não tentar a reeleição, indicando seu vice, o colega de partido Luiz Paulo Corrêa da Rocha (apoiado por PMDB, PL e PSD); o candidato da coligação a senador era o ex-governador Moreira Franco (PMDB). Mas o candidato mais disposto a derrotar o favorito Garotinho era o ex-prefeito carioca Cesar Maia, que tinha encerrado o mandato elegendo seu sucessor, Luiz Paulo Conde, e tinha altas taxas de aprovação na capital fluminense. Ele era o candidato do então PFL (atual DEM), apoiado por PPB (atual PP) - que lançou o veterano político Roberto Campos como candidato ao Senado - e PTB. Treze candidatos se prontificaram a chegar ao Palácio Guanabara, recorde até hoje no estado do Rio após a fusão.
Como o esperado, Garotinho e Cesar chegaram ao segundo turno com certa facilidade: o candidato do PDT obteve 3.083.441 votos (46,9%), e o do PFL conseguiu 2.256.815 (34,3%), entre eles o meu. Também votei em Roberto Campos para senador, mas o eleito foi Saturnino Braga - que, no meio do mandato, se envolveria em uma polêmica com um ex-partido seu, o PDT (pelo qual foi eleito prefeito em 1985): foi acusado por um suplente, Carlos Lupi (atual ministro do Trabalho), de não ter cumprido um acordo na época da eleição, de dar o cargo a ele na metade do mandato. Saturnino admitiu a existência de tal acordo, mas se recusou a cumpri-lo, dizendo-se arrependido. Em 2006, foi impedido pelo PT (ao qual já estava filiado depois de sair do PSB) de tentar a reeleição - o partido preferiu apoiar Jandira Feghali, do PCdoB.
Voltemos a 1998. De pouco adiantou a fama de eficiente do candidato Cesar Maia: os votos do interior e a força pedetista ainda existente na época falaram mais alto. Garotinho foi eleito com 4.259.344 votos (58%), enquanto Cesar ficou com 3.087.117 (42%). Era o canto do cisne do PDT no estado do Rio e o início da Era Garotinho, tão nefasta quanto (ou ainda mais que) a Era Brizola foi (e, de certa forma, continua sendo) para a população fluminense.
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