23.11.08

E SE A ELEIÇÃO PRESIDENCIAL BRASILEIRA SEGUISSE O MODELO AMERICANO?

Tudo bem, as eleições presidenciais norte-americanas foram realizadas no início deste mês - mas tem algo que sinto vontade de escrever.

O sistema eleitoral norte-americano, único no mundo, parece estranho à primeira vista. E é mesmo. Mas tem uma vantagem: o sistema de delegados, cuja quantidade varia por estado de acordo com o número da soma de deputados e senadores de cada um, é um ótimo indicador da importância de cada unidade da Federação dentro do país. Como bem lembrou o Serjão num texto recente, se tal sistema fosse adotado no Brasil não haveria projetos assistencialistas em profusão, como há no país - o governo não derramaria bolsa-qualquer-coisa num estado sem muita relevância caso ele valesse eleitoralmente menos. Ou seja, o populismo estaria desencorajado. De repente, pensei numa coisa: e se o sistema eleitoral americano (em que os candidatos à Presidência concorrem por estado, levando todos os delegados do estado em que seja vitorioso) fosse adotado no Brasil, como seriam as eleições presidenciais brasileiras?

Através de números oficiais do Tribunal Superior Eleitoral, simulei o que seriam eleições presidenciais seguindo o modelo americano desde 1994 (infelizmente, não tenho os números de 1989 divididos por estado). Levando-se em consideração que o número de delegados por estado seria o somatório do número de deputados federais com o de senadores, chegaríamos à impressionante quantidade de 594 votantes no Colégio Eleitoral - o que mostra que o número de parlamentares é excessivo no Brasil, visto que cada UF tem três senadores e, pelo menos, oito deputados federais (nos Estados Unidos, são apenas dois senadores por estado e há estados com apenas um único deputado - portanto, alguns estados têm três delegados no Colégio Eleitoral). O estado com o maior número de delegados seria São Paulo, com 73 (há 70 deputados federais paulistas na Câmara). Minas Gerais teria 56; o Rio de Janeiro, 49; a Bahia, 42; o Rio Grande do Sul, 34. Acre, Amapá, Amazonas, Distrito Federal, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Norte, Rondônia, Roraima, Sergipe e Tocantins, com oito deputados federais cada, teriam o menor número de delegados: onze.

Por haver 594 delegados no total, um candidato precisaria de, pelo menos, 298 votos (metade mais um) para se eleger presidente do Brasil. Caso houvesse mais de dois candidatos eleitos pelos estados e nenhum deles alcançasse o "número mágico", haveria um segundo turno entre os dois mais votados.

Pois bem: em 1994, Fernando Henrique Cardoso (PSDB) seria eleito com tranqüilidade da mesma forma que foi na eleição direta. O então ministro da Economia de Itamar Franco foi o mais votado em 25 das 27 unidades da Federação. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) venceu apenas no Distrito Federal (11 delegados) e no Rio Grande do Sul (34 delegados). No total, FHC teria 549 votos no Colégio Eleitoral brasileiro, contra 45 dados a Lula.

Em 1998, embora com um pouco menos de folga, Fernando Henrique Cardoso seria reeleito presidente - como de certa forma foi, no primeiro turno. Mesmo com um governo um tanto contestado (como seria o de George W. Bush nos Estados Unidos, seis anos depois), FHC conseguiu ser o mais votado em 24 das 27 UFs. Lula foi o mais votado no Rio de Janeiro (49) e, novamente, no Rio Grande do Sul (34). Ciro Gomes (PPS) foi o mais votado no estado em que foi governador, o Ceará (25 delegados). No Colégio Eleitoral, Fernando Henrique teria 486 votos, Lula teria 83 e Ciro Gomes, 25.

Em 2002, Lula teria uma vitória ainda mais folgada da maneira indireta que teve na eleição real, em que teve que derrotar José Serra (PSDB) no segundo turno. O candidato tucano, curiosamente, acabaria em quarto lugar numa eleição à americana. Isso porque ele venceu em um estado que não daria muitos votos no Colégio - Alagoas, que daria 12 delegados. Ciro Gomes venceu novamente no Ceará. Anthony Garotinho (PSB) foi o mais votado no estado do Rio de Janeiro (ao passo que sua esposa Rosinha foi eleita governadora), e Lula foi o vitorioso no restante do país, obtendo 508 votos no Colégio Eleitoral. Garotinho seria o segundo colocado, com os votos dos 49 delegados fluminenses. Ciro Gomes teria os mesmos 25 votos de quatro anos antes; José Serra seria apenas o quarto colocado, com 12 votos.

Em 2006, teríamos a eleição indireta mais disputada, entre Lula e Geraldo Alckmin (PSDB). O ex-governador de São Paulo foi o mais votado em dez estados (Acre, 11; Goiás, 20; Mato Grosso, 11; Mato Grosso do Sul, 11; Paraná, 33; Rio Grande do Sul, 34; Rondônia, 11; Roraima, 11; Santa Catarina, 19; e São Paulo, 73) e no Distrito Federal (11 delegados). A surpresa gaúcha (Lula sempre tinha ganho no Rio Grande do Sul), porém, não seria suficiente para impedir a reeleição do petista - o fiel da balança seria o estado de Minas Gerais, com seus 56 delegados. Se Alckmin tivesse se beneficiado com os votos que reelegeram o governador Aécio Neves com folga no primeiro turno, teria sido eleito presidente. Mas como Lula venceu entre os mineiros, ficaria com 349 votos no Colégio, contra os 245 que seriam dados a Alckmin.

Brincadeira feita, voltemos ao mundo real. É o caso de pensar se seria diferente a atitude dos governos federais se cada unidade da Federação tivesse pesos diferentes para eleger o presidente da República... Como aqui cada cidadão vale um voto, só nos resta fiscalizar os nossos governantes.

2 comentários:

Blogildo disse...

O sistema americano é deveras complexo, mas, acho eu, é sujeito a menos distorções que o sistema brasileiro.
E pensar que tem gente aqui que quer dar aulas de democracia para nosso manos do norte.

Daniel F. Silva disse...

É verdade. Se bem que, lá, tem algumas coisas que seriam impensáveis por aqui. As longas filas de eleitores (e olha que o voto nos Estados Unidos é facultativo) e a desunificação do sistema de votação, por exemplo...

Ah, uma curiosidade que esqueci de botar no texto: se a eleição presidencial americana seguisse o modelo que é seguido em vários países, inclusive o Brasil (com os dois mais votados indo para o segundo turno, no caso de um candidato não conseguir mais da metade dos votos na primeira votação), Obama seria eleito ainda no primeiro turno, com 52,77% dos votos válidos.